segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Wall Street como inimigo público nº 1

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Glen Ford



Em círculos veteranos de esquerda há conversas acerca da necessidade de "educar" politicamente aqueles teimosamente sem liderança, principalmente brancos jovens, que desde 17 de Setembro fizeram do Parque Zuccotti, distrito financeiro em Manhattan, o centro da esquerda estado-unidense.

Embora haja uma grande porção de tolos estilo hippie na composição de Zuccotti – a espécie de activismo que parece mais aroma do que substância – o núcleo é constituído claramente por pessoas sérias e determinadas a acabar com o domínio do "Um Por Cento". A fórmula 99% versus 1% é bastante poderosa, dirigindo a ira do povo contra a classe que conduz seus negócios opressivos na Wall Street: os capitalistas financeiros.

A equipe do Occupy Wall Street (OWS) identificou a besta no seu covil – o que é um grande feito nos Estados Unidos, país que é o mais politicamente atrasado e confuso no mundo industrial devido ao racismo endémico desde o seu nascimento – o que sempre prejudicou o crescimento de uma esquerda forte.

Os que acampam no Zuccotti Park estão anos-luz à frente dos falsos radicais e "progressistas" que, aterrorizados pelo Tea Party e os bufões republicanos candidatos à presidência, em breve retornarão ao aprisco obamista na sua eterna busca do mal menor.

Uma vez que tantas das "velhas cabeças" da esquerda há apenas uns poucos anos atrás colocaram-se ao serviço do candidato presidencial da Wall Street – um talentoso e atraente homem negro que se tornaria de longe o mal mais efectivo ao facilitar o desmantelamento do New Deal – pode ser melhor que mantenham as suas classes de educação política para si próprios.

Ao identificar o capital financeiro como o inimigo comum, os supostamente "apolíticos" ocupantes do parque estão sob certos aspectos mais avançados do que um bocado de sujeitos que se auto-denominam socialistas científicos mas não chegaram a enfrentar plenamente o que isso significa quando o capital financeiro alcança hegemonia política absoluta – uma realidade que é central para determinar como o imperialismo estado-unidense finalmente entrará em colapso.

COMO PIRANHAS

É uma classe [a do capital financeiro] que nada produz; que existe unicamente através do ludíbrio, da coerção de mercados e da destruição de tudo o que não possa ser monetizado; que activamente suprime e faz guerra contra o potencial produtivo humano, à escala mundial; e que se voltou agora, como piranhas, contra as estruturas de estado que ela própria ajudou a construir na Europa e na América do Norte.

O domínio político do capital financeiro é o jogo final. Nas etapas iniciais da Grande Depressão, o barão da banca Andrew Mellow pressionou o presidente Herbert Hoover a "liquidar o trabalho, liquidar as acções, liquidar os agricultores, liquidar o imobiliário" a fim de resolver a crise. Mellon não conseguiu que os seus desejos fossem atendidos porque a classe capitalista financeira ainda não exercia poder hegemónico na sociedade estado-unidense. Ela agora o exerce.

Com todos os outros sectores capitalistas totalmente subservientes à Wall Street – incluindo os meios de comunicação de massa – eles estão a financiarizar o Estado, procurando converter muitos dos seus componentes (Segurança Social, cuidados de saúde, educação pública e muito mais) em centros de lucro e descartando grande parte do resto. Isto é necessário, porque o capital financeiro já não pode preservar-se de qualquer outro modo.

No sector capitalista nada é deixado de pé para lhe resistir. Por essa razão, não há Hoover, muito menos um Roosevelt, para articular uma visão capitalista alternativa, um novo pacto, uma "reforma" acomodatícia. O capital financeiro precipita-se em frente, criando condições nas quais a sua própria destruição iminente pode ser apenas temporariamente impedida pela predação frenética da economia real e do próprio Estado.

Os democratas de Obama e os seus sósias republicanos, cativos da hegemonia, facilitam a pilhagem.

Viver na era da hegemonia capitalista financeira é diferente do tempo em que Vladimir Lenine disse "os capitalistas lhe venderão a corda para os enforcarem". Wall Street diariamente inventa e brinca com fogo com a sua própria forma de dinheiro: derivativos que são nocionalmente valorizados em US$600 milhões de milhões (trillion) a US$1000 milhões de milhões (ninguém realmente sabe), muitas vezes o Produto Planetário Bruto da Terra.

O poder hegemónico das finanças está desconectado da economia real, mas parasita-o. Ele não está no negócio de vender ou fabricar cordas, ou qualquer outra coisa. Ele transforma o mundo em capital, para alimentar o capital, para a transformação do capital. Ele já não pode coexistir com a vida humana.

Portanto, a virtuosa demonização da Wall Street, a sede simbólica e literal da classe que é a ameaça primária à existência humana, é um belo lugar para começar um movimento de massa. A relação 99% – 1% é uma vantagem encorajadora e um reflexo preciso da realidade.

"WALL STREET IS WAR STREET"

A ocupação da Freedom Plaza em Washington, DC, que começou em 6 de Outubro, deveria exibir o governo nacional como o super-poder serviçal do capital financeiro interno e internacional – e Barack Obama como o Serviçal-em-Chefe. O comício da United National Anti-War Coalition (UNAC) em 15 de Outubro no acampamento OWS que assinala o décimo aniversário da guerra estado-unidense ao Afeganistão proclama que "Wall Street is War Street".

E a conferência nacional de 5 de Novembro da Black Is Back Coalition for Social Justice, Peace, and Reparations, em Filadélfia, nos recordará que a guerra europeia contra o resto do mundo começada há mais de cinco séculos atrás ainda está a ser travada em benefício de uma classe predatória cujo endereço primário está exactamente junto ao Zuccotti Park.


Extraído de:
http://resistir.info/eua/w_street_05out11.html
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